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A ocupação do Deserto Desnudo e do Deserto Dourado

 André Figueiredo Rodrigues transformou no livro A Fortuna dos Inconfidentes sua tese de doutorado defendida em 2008, na Universidade de São Paulo. A publicação foi da Editora Globo, São Paulo SP, o livro foi prefaciado em julho de 2009 por Cecília Helena de Salles Oliveira, professora titular do Museu Paulista da Universidade de São Paulo.

O autor deu destaque a comarca do Rio das Mortes e busca respostas à questão de quais seriam as expectativas econômicas e até políticas que poderiam advir pelas suas participações no setor produtivo das Minas Gerais. O livro é de uma riqueza ímpar.

Não entraremos no âmago dos objetivos tratados na obra, nos serviremos apenas dos dados genéricos contidos e que em muito vêm nos auxiliar para o entendimento da sociedade mineira das últimas décadas do século XVII e iniciais do século XVIII.

Nosso interesse é buscar entender o por que da presença do primeiro morador neste Deserto Desnudo no período acima citado. Pertencemos à Comarca do Rio das Mortes e à Freguesia de Carrancas. Hoje o Deserto Desnudo transformou-se em Carmo da Cachoeira, Minas Gerais.

Sobre nossas origens temos muito ainda a aprender. Nossa gratidão a todos que não envidaram esforços para que esta obra viesse a público, em especial ao autor, sua orientadora Laura de Mello de Souza e a Editora Globo.

A sociedade colonial mineira nas décadas finais do século XVII era regulada pelo direito português, as terras eram doadas gratuitamente às pessoas que possuíam meios de cultivá-las. Essas terras eram chamadas de sesmarias e, em sua concepção original, sua doação foram disciplinada por lei de 1375. 

Na América a ideia da Coroa ao adotar o sistema de sesmaria era a de ter uma colônia com terras produtivas. Essa era a maneira formal e legal de obtenção de terras. Além da sesmarias, desenvolveu-se outra forma: a posse. Por ela ser mais adaptada à agricultura rudimentar que se praticava no período colonial, tornou-se o meio principal de apropriação territorial.

Pela doação de carta de sesmarias, as autoridades legalizavam a posse de terras ocupadas com atividades agrícolas e de pastagens, permitindo que essas práticas se voltassem para o mercado interno. As terras produziam alimentos, serviam de suporte para a criação de animais, implantação de engenhos de cana-de-açúcar e de aguardente. Produziam, também, tecidos grosseiros. Era uma intensa rede comercial que circulava pelos caminhos mineiros.

Várias propriedades se dedicavam ao cultivo variado de legumes, frutas, verduras e criação de gado, além da produção de cana e cachaça. Diferentemente do que ocorria nas plantações açucareiras da Bahia, especializadas e voltadas para o mercado externo, em Minas a cana e seus subprodutos eram destinados ao consumo local.

Os pequenos e médios agricultores limitavam-se à produção da rapadura e da cachaça, pois a fabricação do açúcar era muito dispendiosa.

O milho foi um dos mais importantes produtos agrícolas do horizonte agrário mineiro, sendo consumido por todos os estratos sociais e, também, como alimento de animais. Aqui, na Comarca do Rio das Mortes e freguesia das Carrancas, nos finais do século XVIII residia a família de Maria da Costa Moraes e seu marido Manoel Antonio Rates junto ao ribeirão e aos pés do Morro do Bom Sucesso - hoje conhecido como o Morro do Cruzeiro. Partilhando o espaço do alto do morro está, também, o Cristo Redentor, em cujos pés fica a cidade de Carmo da Cachoeira, em Minas Gerais.

Eram moradores, também, na Comarca do Rio das Mortes, no entanto, no Deserto Dourado a família e os descendentes de Domingos Rodrigues Barreiros e do alferes Manoel Francisco Terra c.c Ana Vitória Barreiros, filha do Capitão Domingos Rodrigues Barreiros e de Jacinta Bernarda da Conceição. O casamento de Manoel Francisco Terra e Ana Vitória Barreiros, ocorreu na Ermida de São Bento do Campo Belo, filial da matriz de Santana das Lavras do Funil, na região do Rio das Mortes.

Em 1738 o sogro de Manoel Francisco Terra fez o pedido e recebeu a sesmaria em Brumado, termo de São João del Rei, onde era morador. A sesmaria foi assinada em Va. Rica a 3 de julho anno de 1747, assinado pelo secretário do governo Antonio de Sousa Machado // Gomes Freire de Andrada.

Esta sesmaria foi trocada pela sesmaria situada entre São Bento Abade e Carmo da Cachoeira, perto da cidade de Lavras, em Minas Gerais. Manoel Francisco Terra e Ana Vitória Barreiros foram morar no Distrito de Carrancas no local chamado Sertão Dourado, mais tarde denominado Fazenda Bom Retiro dos Barreiros. Anos depois, parte dela, passa a se chamar “Fazenda dos Barreiros” e “Fazenda dos Terras”.

Essas fazendas em 1790 tinham como divisas a Fazenda Boa Vista cujo proprietário era José Joaquim Gomes Branquinho, a Fazenda Ponte Falsa e a Fazenda Chamusca de Antonio Dias de Gouvêa, entre outras.

Para Norbert Elias, na sociedade da época interagiam "indivíduos interdependentes" e relacionados por meio de "laços invisíveis", baseados na associação de pessoas em um fluxo simultâneo e contínuo de tempo: laços de trabalho, propriedade, afetividade, amizade, familiares, políticos, econômicos, entre outros, que configuravam uma rede de dependências que se projetavam sobre o caráter dos indivíduos.

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